Por que, em uma sina surpreendente,
todos os que se envolveram com o ex-presidente enfrentaram grandes reveses em
suas vidas, e alguns até destinos trágicos
Fernando Collor de
Mello, ex-presidente
O
ex-presidente e atual senador Fernando Collor (PTB-AL) é lacônico quando
comenta a história de que paira uma maldição sobre as cabeças daqueles que
contribuíram ativamente para o seu impeachment, em 1992. “Sou uma pessoa que
crê em Deus. Deus põe, Deus dispõe”, diz ele. O fato é que, um a um, todos os
principais protagonistas da investigação que desvendou o esquema de corrupção
comandado por Paulo César Farias, ex-tesoureiro de Collor, acabaram passando
por martírios – em alguns casos bem maiores que os do próprio ex-presidente. É
uma fieira de mortes trágicas, doenças graves, acidentes, cassações e
reputações comprometidas. É daí que surgiu a idéia de uma “maldição do
impeachment”. A última vítima dessa praga parece ter sido o prefeito de Nova
Iguaçu, Lindberg Farias. Ex-presidente da União Nacional dos Estudantes durante
o processo de impeachment, Lindberg foi o principal líder da “geração
cara-pintada” que, vestida de preto, saiu às ruas pedindo a deposição de
Collor. Era o início de uma trajetória que pretendia galgar Lindberg à condição
de jovem líder político. Lula apostava alto nele como nova geração petista na
qual se deveria investir. Colhido pelas denúncias publicadas por ISTOÉ,
Lindberg agora responde a processo movido pelo Ministério Público. Poderá ficar
inelegível nas eleições de outubro. No mínimo, será um dissabor grande para
quem começou a política chamando Collor de “ladrão”.
Collor rejeita a tal
maldição. Repete que é católico, devoto de Nossa Senhora de Fátima (ele anda
sempre com um button com a imagem da santa na lapela, ao lado do button dourado
de senador). “Inventam muitas coisas a meu respeito”, diz ele. Mas o fato é que
sua ex-mulher Rosane Collor e uma ex-mãe-de-santo, Maria Cecília da Silva, têm
repetido com freqüência que sessões de magia negra aconteciam nos
jardins da Casa da Dinda, a mansão que a família de Collor tem no Lago
Norte de Brasília, onde ele morava quando era presidente. Rosane e a ex-Mãe
Cecília – assim ela era conhecida quando mãe-de-santo – se converteram ambas à igreja
evangélica El Shaddai. A última vez que Rosane contou detalhes sobre as sessões
de magia negra foi ao jornal evangélico Folha Universal, no dia 28 de
fevereiro. Segundo Rosane disse ao jornal, Collor acreditava que “os trabalhos
poderiam mandar o mal de volta” sobre quem desejava algo ruim a ele. De acordo
com o que relatam Rosane e a ex-Mãe Cecília, galinhas e outros animais eram
sacrificados durante esses rituais.
O
que Collor de fato fazia nos famosos jardins da Dinda, só quem esteve presente
pode saber. A verdade, porém, é que o destino daqueles que se opuseram a ele e
foram protagonistas do processo de impeachment realmente impressiona. A começar
por seu irmão Pedro Collor, autor da primeira denúncia contra o ex-presidente.
Ainda enquanto se desenrolava o processo, Pedro Collor descobriu que tinha um
tumor maligno no cérebro. A doença avançou de forma rápida e, dois anos depois,
em 1994, o irmão mais novo de Collor morreu. É verdade, porém, que o câncer
parece ser um fator genético na família. O irmão mais velho de Collor,
Leopoldo, também padece em São Paulo com a doença.
O
outro principal denunciante do esquema, Francisco Eriberto França, tem sofrido
problemas com os quais ele não contava quando resolveu dizer o que sabia.
Eriberto era motorista da Presidência e resolveu contar à ISTOÉ que muitas
vezes era encarregado de pegar dinheiro de propinas no escritório de Collor e
do ex-piloto de seu avião a jato, conhecido por Morcego Negro, Jorge Bandeira
de Mello. Embora não esperasse necessariamente recompensas, Eriberto sonhava
com algum reconhecimento. Chegou a tentar a vida política. Fracassou. Depois de
pular por vários empregos, chegou ao fundo do poço, vivendo por alguns anos
como guardador de carros nas ruas, quando não chegava a tirar R$ 300 por mês.
Hoje, vive com um salário de R$ 1,8 mil como auxiliar de produção na Radiobrás,
TV estatal do governo. Eriberto não fala diretamente sobre uma possível
maldição, mas uma das suas maiores rotinas é reclamar da falta de sorte. “Às
vezes, bate um certo arrependimento”, confessa. “Esperava um pouco mais dos
políticos que me incentivaram a contar o que eu sabia”, considera.
Pivô do escândalo que culminou com o impeachment,
PC Farias nunca rompeu publicamente com Collor. Mas os dois afastaram-se após a
deposição do ex-presidente. PC chegou a fugir do País para não ser preso.
Falase na existência de dinheiro que PC arrecadou e nunca apareceu. De qualquer
modo, em 1996, Paulo César Farias foi assassinado em sua casa na praia de
Guaxuma, ao lado de sua namorada, Suzana Marcolino. No campo das mortes
trágicas, há ainda a do deputado Ulysses Guimarães, que, com seu prestígio,
ajudou a sepultar as chances de Collor ao cunhar uma frase histórica pouco
antes da votação que aprovou na Câmara o início do processo de impeachment.
Collor o havia chamado de senil. “Sou velho, mas não sou velhaco”, respondeu
Ulysses. O Senhor Diretas e Senhor Constituinte não chegou sequer a
assistir à deposição de Collor. Em outubro de 1992, um helicóptero que
transportava Ulysses caiu no mar próximo de Angra dos Reis, no Rio de Janeiro.
O deputado desapareceu e seu corpo jamais foi encontrado.
Os
políticos envolvidos com o impeachment, procurados por ISTOÉ, evitaram falar em
maldição, até por não quererem admitir publicamente que passaram ou passam por
maus momentos. Ibsen Pinheiro, que presidia a Câmara, foi cassado dois anos
depois, envolvido no escândalo dos anões do Orçamento. Benito Gama e Amir
Lando, respectivamente presidente e relator da CPI do PC, estão hoje no
ostracismo político, recolhidos aos seus Estados de origem, Bahia e Rondônia,
por não conseguirem mais se reeleger. Duas ex-estrelas petistas de primeira
grandeza, José Dirceu e José Genoino, que como deputados foram implacáveis na
denúncia de Collor, cairiam em desgraça no primeiro mandato do presidente Lula,
abatidos pelo escândalo do mensalão. Dirceu teve inclusive seu mandato de
deputado cassado, mas Genoino voltou à Câmara em 2006, embora como pálida
sombra do grande articulador que foi no passado. A vítima mais recente foi o
senador Renan Calheiros (PMDB-AL). Na era collorida, Renan era o líder do
governo na Câmara. Depois que estourou o escândalo, acabou rompendo com o
ex-presidente e, numa entrevista, confirmou a existência do esquema. Durante um
bom tempo, ele parecia ter escapado da maldição. Virou ministro da Justiça no
governo Fernando Henrique Cardoso e presidente do Senado na era Lula. Quando
tudo parecia lhe sorrir, justamente no momento em que Collor elege-se senador,
aparece a história de que ele tivera uma relação extraconjugal com a jornalista
Mônica Veloso e que, dessa relação, nascera uma filha. Da briga por pensão,
surgiram denúncias de corrupção e enriquecimento ilícito. Para escapar da
cassação, que parecia iminente, Renan renunciou à presidência do Senado.
A LISTA DOS ATINGIDOS
A trajetória trágica
ou infeliz dos principais protagonistas do processo de impeachment
Como presidente da
UNE, foi o símbolo principal da geração cara-pintada, que saiu de preto às ruas
para exigir o impeachment de Collor. Filiado ao PT, elegeu-se prefeito de Nova
Iguaçu. Agora é investigado por suspeita de corrupção na prefeitura. Veja reportagem aqui: http://www.terra.com.br/istoe-temp/edicoes/2010/imprime88170.htm
Ex-líder de Collor na
Câmara, Renan rompeu com ele durante a investigação do esquema. Em 2008 renunciou
à presidência do Senado acusado de usar dinheiro de uma empreiteira para pagar
pensão à ex-amante
Como deputado do PT,
Dirceu foi um dos mais ativos parlamentares do impeachment. Chefe da Casa Civil
de Lula, deixou o governo por envolvimento no escândalo do mensalão e foi
cassado como o “chefe da quadrilha”
Deputado federal e uma
das principais lideranças do PT na Câmara. Eleito presidente do PT, envolveu-se
no escândalo do mensalão. Renunciou à presidência, mas voltou à Câmara em 2006,
embora com prestígio reduzido
Presidente da CPI,
colocado no posto por ACM para ser aliado de Collor na investigação. Ao ver a
gravidade das denúncias, mudou de lado. Rompido com ACM, perdeu espaço político
e não conseguiu reeleger-se deputado
Presidente da Câmara,
conduziu o processo que culminou no impeachment. Em 1994 viu-se envolvido na
investigação da CPI do Orçamento, e acabou cassado. Voltou à Câmara em 2006,
mas não tem o mesmo peso político
Relator da CPI do PC.
Foi ministro da Previdência no governo Lula, mas saiu pouco tempo depois,
reclamando de falta de espaço. Não conseguiu reeleger-se senador, e hoje vive
uma situação de ostracismo.
O irmão do presidente
foi o primeiro a denunciar do esquema montado por Paulo César Farias. Logo depois
do impeachment, Pedro Collor descobriu que tinha um tumor no cérebro. Morreu em
1994.
Ex-tesoureiro da
campanha de Collor, PC foi o mentor do esquema de propinas. Acabou assassinado,
junto com sua namorada, Suzana Marcolino, na sua casa na praia de Guaxuma,
próxima de Maceió, em 1996.
Durante o processo de
impeachment, a imagem de Ulysses foi fundamental para dar credibilidade ao
processo. Em outubro de 1992, morreu em um acidente de helicóptero perto de
Angra dos Reis. Seu corpo nunca foi encontrado.
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