"Que tal ser fiel ao
desejo?"Ao fechar o programa com essa interrogação, Pedro Bial proclamou
sua opção contra o casamento, contra a fidelidade conjugal, e optou pela
degradação do humano.
Pois não é que dia desses me peguei
assistindo o programa "Na moral"? Por Deus. Estava ali, deitado,
zapeando, e me deparo com Pedro Bial entrevistando convidados. Como peguei o
bonde andando, presumo que a pauta fosse sobre arranjos de convívio sexual. Um
terreno complicado, onde há de tudo. E havia, mesmo, um pouco de quase tudo.
A personagem central da primeira
entrevista que assisti era uma senhora muito dadivosa que se alternava entre
dois cônjuges. Ora com um, ora com outro. Levava a vida assim, contando com o
consentimento de ambos, por sinal, presentes à entrevista. Um dos homens, mesmo
sem ser chamado às falas a respeito, fez seu comercialzinho aduzindo que,
pessoalmente, não descartava relacionar-se, também, com outros do mesmo sexo,
desde que fossem interessantes. Enquanto assistia aquilo, fiquei pensando que,
muito em breve, com a multiplicação de tais casos, o Supremo Tribunal Federal
será chamado a sacramentá-los. E o fará, numa sessão em que o Congresso, lá do
outro lado da praça, ouvirá doutas repreensões por silenciar ante assunto de
tamanha relevância e interesse social. Assim, face à omissão legislativa,
em nome dos princípios da liberdade, da igualdade e da dignidade da pessoa
humana, o STF tomará em suas mãos a deliberação sobre os aspectos jurídicos
desses enroscos sexuais. São coisas que existem desde que o mundo é mundo. Já
são tema para novela. Novidade é a colher torta do Estado se metendo no meio.
Aliás, já existem advogados da tese. E em Tupã, interior do São Paulo, li outro
dia, um conluio desse tipo foi formalizado em cartório.
Seguiu-se uma entrevista sobre suingue
(eis aí mais uma, STF!). No caso, o marido levava a esposa para assistir seu
desempenho com outras mulheres em festas de casais liberais.
Surpreendentemente, ele não admitia a recíproca por ser muito ciumento...
Noutro bloco, com som e imagem distorcidos, o Bial ouviu mulheres e homens,
casados regularmente, que mantinham relações extraconjugais clandestinas
valendo-se, para tanto, de sites de relacionamento. Por fim, a produção do
programa arranjou-lhe um petisco adicional, uma extravagância, coisa inaudita,
beirando ao escândalo - tira as crianças da sala, meu bem!: um casal formado
por homem e mulher (o esclarecimento é politicamente corretíssimo), que viviam
seu matrimônio há 42 anos. Quarenta e dois anos? E nunca pularam a cerca?
Nunca, segundo informaram.
Do jeito que a coisa anda, tratou-se,
obviamente de um programa banal, tratando tais temas como se banalidades
fossem. Nada de novo em qualquer das situações focadas. Coisas melhores e
piores são exibidas todos os dias. E ninguém tem nada que ver com a intimidade
alheia. O completo absurdo, o motivo pelo qual escrevo, veio pouco depois, no
encerramento do programa. O apresentador encarou a câmera, fez um discurso resumindo
cada uma das situações que apresentara e sublinhou o surpreendente feito do
casal casado, fiel, a caminho das bodas de ouro. E arrematou com uma pergunta
que, apesar de dirigida aos telespectadores, fustigou a aparentemente insólita
situação vivida por ambos: "Que tal ser fiel ao desejo?"
Ao fechar o programa com essa
interrogação, o apresentador proclamou sua opção contra o casamento, contra a
fidelidade conjugal, e optou pela degradação do humano. Fidelidade ao desejo,
conforme proposto pelo jornalista, se expressa numa vida desregrada, sobre a
qual não se impõem os freios da razão e do amor.
Publicado no jornal Zero Hora.
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