Mito tribal: O Cavaleiro
Solitário, estrelando Johnny Depp como o índio Tonto
* No entanto, Johnny Depp quer representar o índio Tonto em uma roupagem
mais simpática
Jonathan Foreman
O
rosto da menina de 16 anos, antes atraente, estava grotesco.
Havia
sido desfigurada ao ponto de estar irreconhecível durante os 18 meses em que
foi mantida prisioneira pelos índios comanches.
Agora,
estava sendo oferecida de volta às autoridades do Texas pelos chefes indígenas
como parte de uma negociação de paz.
Diante
de suspiros de choque da audiência, os índios a apresentaram na sede conselho
do povoado de San Antonio em 1840, ano em que a Rainha Vitória do Reino Unido
se casou com o Príncipe Albert.
“Sua
cabeça, seus braços e seu rosto estavam cheios de ferimentos e feridas”,
escreveu uma testemunha, Mary Maverick. “E seu nariz estava queimado até o
osso. As narinas estavam escancaradas e sem carne”.
Assim
que foi entregue, Matilda Lockhart entrou em desespero ao descrever os horrores
que teve que suportar — os estupros, a contínua humilhação sexual e a forma
como as mulheres comanches a torturavam com fogo. Não foi somente o nariz, seu
corpo magro havia sido cruelmente marcado dos pés á cabeça com queimaduras.
Quando
ela mencionou acreditar que havia 15 outros prisioneiros brancos no campo dos
índios, todos sendo submetidos a condições similares, os legisladores e as
autoridades texanas disseram que iriam deter os líderes comanches até
resgatarem os outros.
Foi
uma decisão que desencadeou uma das matanças mais brutais da história do Velho
Oeste, e mostrou quão sanguinários os comanches poderiam ser na sua vingança.
S
C Gwynne, autor de "Empire Of The Summer Moon about the rise and fall of
the Comanche” (Império da Lua de Verão sobre a ascensão e queda dos comanches),
afirma simplesmente que: “Nenhuma tribo na história das ocupações espanholas,
francesas, mexicanas, texanas e americanas desta terra causaram tanta
destruição e morte. Nenhum outro sequer chegou perto”.
Ele
menciona a “imoralidade demoníaca” dos ataques comanches nos assentamentos dos
brancos e da forma como torturas, assassinatos e estupros coletivos eram
rotina. “A lógica dos ataques comanches era objetiva”, ele explica.
“Todos os homens eram mortos, qualquer homem capturado vivo era
torturado, e as mulheres prisioneiras eram estupradas. Os bebês sempre eram
mortos”.
Bilheteria: Johnny Depp
interpreta a versão hollywoodiana do estilo de vida dos americanos nativos em
novo filme
Você
não saberia disso pelo novo filme O Cavaleiro Solitário, que estrela Johnny
Depp como o índio Tonto.
Por
razões que só eles sabem, os produtores mudaram a tribo de Tonto para Comanche.
No seriado de TV, ele era membro da tribo Potowatomi, relativamente passiva.
No
entanto, ele e seus conterrâneos nativos são apresentados no filme como
angelicais vítimas de um Velho Oeste onde eram os colonizadores brancos, os
homens que construíram a América, que representam nada a não ser exploração,
brutalidade, destruição ambiental e genocídio.
Depp
teria dito que queria atuar como Tonto para retratar os americanos nativos com
uma roupagem mais simpática. Mas os próprios comanches nunca demonstraram
simpatia.
Quando
aquela delegação de índios em San Antonio percebeu que iria ser detida, eles
lutaram para fugir com flechas e facas, matando todos os texanos que puderam
alcançar. Os soldados texanos, por sua vez, abriram fogo, matando 35 comanches,
ferindo muitos outros e fazendo 29 prisioneiros.
Mas
a resposta furiosa da tribo comanche não tinha limites. Quando os texanos
sugeriram uma troca dos prisioneiros comanches pelos seus próprios, os índios
preferiram torturar todos até a morte.
“Uma por uma, as crianças e jovens mulheres foram amarradas próximo à
fogueira”, segundo um relato da época. “Elas tiveram a pele arrancada, foram
cortadas e horrivelmente mutiladas, e finalmente queimadas vivas por mulheres
vingativas determinadas a espremer o último grito e a última convulsão de seus
corpos agonizantes”. A irmã de Matilda Lockhart, de apenas seis anos, estava
entre os desafortunados que morreram aos gritos sob a luz da lua nas altas
planícies”.
Vida real: Lobo Branco,
chefe comanche, fotografado no final do século XIX
Os
comanches não eram somente especialistas em tortura, eram também os guerreiros
mais ferozes e bem sucedidos, chegando a ser conhecidos como “Lordes das
Planícies”.
Eram
tão imperialistas e genocidas quanto os colonos brancos que mais tarde os
derrotariam.
Quando
eles migraram para as grandes planícies do sul dos EUA no final do século XVIII
vindos das Montanhas Rochosas (Rocky Mountains), eles não somente dominaram as
tribos que lá habitaram como quase exterminaram os apaches, que estavam entre
os melhores guerreiros montados do mundo.
A
chave para o sucesso brutal dos comanches era que eles se adaptaram ao cavalo
até mais habilmente que os apaches.
Não
havia um cavalo sequer nas Américas até que os conquistadores espanhóis os
trouxessem. E os comanches eram uma tribo pequena e relativamente primitiva que
vagava pela área onde agora estão os estados de Wyoming e Montana, até por
volta de 1700, quando, ao migrarem para o sul, descobriram cavalos espanhóis
selvagens que haviam escapado do México.
Sendo
os primeiros índios a montarem um cavalo, tinham uma aptidão para cavalgar
similar à dos mongóis de Gengis Khan. Somando à sua notável ferocidade, isso
lhes permitiu dominar mais território que qualquer outra tribo indígena: o que
os espanhóis chamaram de Comancheria se espalhou por pelo menos 400 km.
Eles
aterrorizaram o México e contiveram a expansão da colonização espanhola na
América. A tribo roubava cavalos para montar e gado para vender, geralmente em
troca de armas de fogo.
Qualquer
outro tipo de vida era morto, incluindo bebês e idosos (mulheres mais velhas
geralmente eram estupradas antes de mortas), deixando o que os mexicanos
chamaram de “mil desertos”. Quando seus guerreiros eram mortos, consideravam
questão de honra buscar uma vingança que envolvia tortura e morte.
Os
colonos no Texas tinham absoluto pavor dos comanches, que eram capazes de
viajar quase 2000 km para matar uma única família branca.
O
Historiador T R Fehrenbach, autor de Comanche: The History Of A People
(Comanche: A História de um Povo), conta sobre um ataque a uma das primeiras
famílias de colonos de sobrenome Parker, que, junto com outras famílias,
construíram uma paliçada conhecida como Forte Parker. Em 1836, 100 comanches
montados apareceram às portas do forte, um deles segurando uma bandeira branca
para enganar os Parkers.
“Benjamin
Parker saiu para negociar com os comanches” conta o historiador. “As pessoas
dentro do forte viram quando os índios subitamente o cercaram e o crivaram com
suas lanças. Depois, aos berros de empolgação, os guerreiros montados correram
para a entrada do forte. Silas Parker foi morto antes que pudesse barrar a
entrada, e eles se espalharam pelo forte”.
Os
sobreviventes descreveram a matança: “Pai e filho da família Frost foram mortos
na frente das mulheres; Elder John Parker, sua esposa ‘Granny’ e outros
tentaram fugir. Os guerreiros se espalharam e os derrubaram.
“John
Parker foi pregado ao chão, depois escalpelado e teve os genitais arrancados.
Depois foi morto. Granny Parker foi despida e fixada à terra perfurada por uma
lança. Vários guerreiros a estupraram enquanto ela gritava.
A
mulher de Silas Parker Lucy, fugiu por um portão com seus quatro filhos
pequenos. Mas os comanches os alcançaram perto do rio. Eles jogaram ela e as
quatro crianças sobre os cavalos para leva-los como prisioneiros”.
A
crueldade comanche era tão intimidadora que quase todos os ataques de nativos
eram atribuídos a eles. Texanos, mexicanos e outros índios que viviam na região
todos desenvolveram um medo particular com lua cheia (até hoje conhecida como
“lua comanche” no Texas) porque era quando os comanches saíam para roubar gado,
cavalos e prisioneiros.
Eram
famosos por suas torturas engenhosas, e o processo de tortura geralmente cabia
às mulheres.
Os
comanches assavam na fogueira soldados americanos e mexicanos até a morte.
Outros eram castrados e escalpelados vivos. As torturas comanches mais
agonizantes incluíam enterrar prisioneiros até o queixo e cortar suas pálpebras
para que seus olhos fossem queimados pelo sol antes de morrerem de fome.
Relatos
da época também descrevem que eles colocavam prisioneiros homens com as pernas
e os braços abertos sobre ninhos de formigas lava-pés. Às vezes isso era feito
depois de cortarem os órgãos genitais da vítima, enfiá-los em sua boca e costurar
seus lábios.
Um
bando costurou prisioneiros em couro cru e os deixou ao sol. O couro lentamente
encolhia e esmagava os prisioneiros até a morte.
T R Fehrenbach cita um relato de espanhóis que descrevia comanches
torturando índios tonkawa, segundo o qual eles queimavam as mãos e os pés da
vítima até que os nervos estivessem destruídos, depois amputavam essas
extremidades e recomeçavam o tratamento de fogo nas feridas vivas. Escalpelados
vivos, os Tonkawas tinhas as línguas arrancadas para pararem de gritar.
Representação clássica:
Clayton Moore como o Cavaleiro Solitário na década de 50 e Jay Silverheels, que
fazia o papel de Tonto.
Os
comanches sempre lutaram até a morte, pois esperavam o mesmo tratamento dos
seus próprios prisioneiros. Os bebês eram quase sempre mortos nos ataques,
embora dissessem que soldados e colonos eram tendentes a matar mulheres e
crianças comanches, se deparassem com elas.
Os
jovens comanches, incluindo prisioneiros, eram criados para se tornarem
guerreiros e tinham que sobreviver a ritos sangrentos de passagem. As mulheres
com frequência lutavam ao lado dos homens.
É
possível que a violência dos comanches fosse em parte derivada dos seus
encontros violentos com colonos espanhóis notoriamente cruéis, além de bandidos
e soldados mexicanos.
Mas
uma teoria mais convincente é a de que a falta de uma liderança central dos
comanches induziu muito dessa crueldade. Os bandos comanches eram associações
pouco rígidas de guerreiros/pilhantes, como uma confederação de pequenas
gangues.
Em
toda sociedade, adolescentes na casa dos vinte são os mais violentos, e mesmo
se quisessem, os chefes tribais dos comanches não tinham como impedir seus
jovens de cometer ataques.
Mas
os comanches encontraram um adversário à altura com os rangers texanos.
Brilhantemente retratados nos livros de Larry McMurtry da série Lonesome Dove,
os rangers começaram a ser recrutados em 1823, principalmente para lutar contra
os comanches e seus aliados. Eles eram uma tenaz força de guerrilha, tão
impiedosa quanto seus adversários comanches.
Eles
também os respeitavam. Um dos rangers personagens dos livros de McMurtry disse
ironicamente a um homem que afirmou ter visto um bando de mil comanches: “Se um
dia houvesse mil comanches em um bando, eles teriam tomado Washington”.
Os
rangers do Texas muitas vezes saíram em desvantagem contra seus inimigos, até
que aprenderam a lutar como eles, e até receberem o novo revolver Colt.
Durante
a Guerra Civil, quando os rangers saíram para lutar pelos Estados Confederados,
os comanches recuaram a fronteira americana e os assentamentos dos brancos em
mais de 150 km.
Mesmo
depois que os rangers voltaram e o exército americano se uniu às campanhas
contra os comanches, o Texas perdeu uma média de 200 colonos por ano até a
Guerra do Rio Vermelho em 1874, quando o exército com toda a sua força, além da
destruição dos grandes rebanhos de búfalos dos quais os comanches dependiam,
pôs fim às depredações.
Curiosamente,
os comanches, embora hostis a todos os outros povos que encontravam, não tinham
senso de raça. Eles complementavam seus números com jovens americanos e
mexicanos capturados, que se tornavam integralmente membros da tribo se
tivessem potencial para a guerra e fossem capazes de sobreviver aos ritos de
iniciação.
Os
prisioneiros mais fracos podiam ser vendidos a comerciantes mexicanos como
escravos, porém geralmente eram mortos. Mas apesar da crueldade, alguns dos
jovens capturados que mais tarde eram resgatados se viam incapazes de se
adaptar à vida “civilizada” dos colonos e fugiam para se reunir aos seus
irmãos.
Um dos grandes chefes comanches, Quanah, era filho de uma branca
capturada, Cynthia Ann Parker. Seu pai foi morto em um ataque feito pelos
rangers, o que resultou no resgate de sua mãe da tribo. Ela nunca se adaptou à
vida na civilização e parou de comer até a morte.
Versão maquiada: Depp disse
que queria caracterizar Tonto de uma maneira mais simpática.
Quanah
se rendeu ao exército americano em 1874. Ele se adaptou bem à vida em uma
reserva, e os comanches, surpreendentemente, se tornaram uma das tribos mais
economicamente bem-sucedidas e assimiladas.
Como
resultado, as principais reservas comanches foram fechadas em 1901, e os
soldados comanches serviram no exército americano com distinção nas Guerras
Mundiais. Até hoje eles estão entre os americanos nativos mais prósperos,
notórios pela educação.
Ao
interpretar a tribo indígena mais cruel e agressiva como meros inocentes
vítimas da opressão, Johnny Depp perpetua o mito condescendente e ignorante do
“bom selvagem”.
Isso
não só é uma caricatura da realidade, mas não ajuda em nada os índios que Depp
quer tão avidamente apoiar.
Traduzido por
Luis Gustavo Gentil do original do Daily Mail: The truth Johnny Depp wants to hide about the real-life
Tontos
Fonte: www.juliosevero.com
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