O mercado de votos que ainda assola o
Brasil
MARCELO ROCHA E HUDSON
CORRÊA
Na lista das profissões
em extinção num Brasil que se moderniza, está o carroceiro. Os poucos que resistem evocam gravuras de Debret
(1768-1848), o pintor francês que fez a crônica visual do Brasil Colônia. No tempo de Debret,
eles transportavam tonéis de água num Rio de Janeiro onde não havia saneamento
básico. No Brasil
de hoje, puxam pesadas
carroças de lixo
reciclável,
em troca de vencimentos que raramente chegam ao salário mínimo. Na cidade
mineira de Betim, município da Grande Belo Horizonte, um carroceiro ganha em média R$ 600 por mês. Para ele, R$ 280 fazem diferença no orçamento. É essa a quantia
que o candidato Carlaile Pedrosa (PSDB) paga a carroceiros em troca de apoio
político – como mostra um vídeo obtido com exclusividade por ÉPOCA e que evoca, na era da urna eletrônica, o Brasil do tempo das
carroças. As imagens abaixo mostram Carlaile, postulante à cadeira de prefeito de Betim, chegando de carro a
um bairro pobre da cidade. Logo depois, uma correligionária dele se encontra
com carroceiros. Tira do envelope um maço de dinheiro. Eles ficam felizes. “Só de o pagamento ser em dinheiro já tá bom demais. Da outra
vez foi em cheque”, afirma um deles. “Vai ter mais 140 ou é só este?”, diz outro – e é
imediatamente informado de que receberá a mesma quantia depois do pleito, caso Carlaile seja eleito. As
imagens evocam, tristemente, o folclore do tempo dos coronéis, quando lavradores descalços recebiam o pé direito do sapato
antes da eleição, e o pé esquerdo depois, apenas no caso de vitória do
candidato.
O Rio de Janeiro de 2012, cidade que se
prepara para receber uma Olimpíada e uma final da Copa do Mundo, também tem práticas eleitorais que lembram o Brasil
das carroças. Um relatório obtido com exclusividade por ÉPOCA revela como as milícias – brigadas fora da lei que vendem proteção e outros serviços em
bairros pobres – cobram pedágio de candidatos que querem fazer campanha em seus
“territórios”. De acordo com a apuração comandada pelo procurador da República Maurício da Rocha
Ribeiro, chefe do Ministério
Público Eleitoral no Estado do Rio de Janeiro, o preço-padrão cobrado de candidatos a prefeito é R$ 10 mil, enquanto os vereadores têm de pagar R$ 4 mil. As milícias se
concentram na Zona Oeste da capital carioca e na Baixada Fluminense. As
investigações partiram de um relatório do disque-denúncia – que recebeu 126 queixas de irregularidades nas eleições, 25 delas
apontando envolvimento
de candidatos
com milícias e outras 25 com traficantes de drogas. Nas regiões
dominadas por esses traficantes, o pedágio é ainda mais caro – pode chegar a R$ 50 mil.
FONTE: REVISTA ÉPOCA
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