Comentário de
Julio Severo: O artigo da revista Veja,
que disponibilizo abaixo, traz pontos interessante sobre demografia, pontos já
amplamente cobertos por meu blog durante vários anos.
Mas a reportagem da Veja erra
feio ao finalizar elogiando o envelhecimento demográfico de várias nações. Na
opinião daVeja, uma população mais idosa é mais pacífica — em outras
palavras, é mais domesticável e fácil de domar.
Veja interteprou
uma população jovem como fonte de conflitos, em perfeita sintonia com o notório
Kelatório Kissinger, documento do governo dos EUA elaborado na primeira metade
da década de 1970 defendendo a redução drástica de populações de países em que
os EUA têm interesses estratégicos de matérias-primas.
O infame relatório, cujos extratos em
português foram traduzidos por mim no início da década de 1990 e
disponibilizados neste link (http://www.providafamilia.org.br/doc.php?doc=doc17753),
defendia ações do governo americano para manipular a ONU, o Banco Mundial, a
Organização Mundial de Saúde e outras instituições internacionais em sua
ambição de reduzir a população de outros países.
A conseqüência dessa redução é uma
diminuição significativa do número de jovens e aumento de idosos. Hoje vemos as
conseqüências das recomendações implementadas do Relatório Kissinger. Mas
admira-me ver Veja elogiando o envelhecimento demográfico.
Para ter uma idéia do que será tal
envelhecimento, recomendo a leitura de dois artigos antigos meus:
Eis agora o artigo da revista Veja,
cuja parte final elogiando o envelhecimento demográfico dispensei por sua
completa inutilidade.
Pressões demográficas redesenham a arena política
O crescimento populacional nunca foi tão desigual, e as discrepâncias
entre os perfis demográficos de países, grupos étnicos, religiosos e econômicos
exercerão cada vez mais influência sobre as disputas pelo poder
Cecília Araújo
Em uma de suas assombrosas previsões, o
francês Alexis de Toqueville cravou em 1835 que Estados Unidos e Rússia
disputariam o futuro do planeta. A célebre passagem encerra o primeiro volume
de A Democracia na América: "Existem hoje, sobre a terra, dois
grandes povos que, tendo partido de pontos diferentes, parecem adiantar-se para
o mesmo fim: são os russos e os anglo-americanos (...) O americano tem por
principal meio de ação a liberdade; o russo, a servidão. (...) Cada um deles
parece convocado, por um desígnio secreto da providência, a deter nas mãos, um
dia, os destinos de metade do mundo".
Notas de rodapé mostram que o
historiador se valeu de numerosos dados demográficos para antever a polarização
que marcou o planeta no século XX: a população das grandes e pequenas cidades,
o número de trabalhadores rurais, a proporção de escravos, índios, imigrantes,
os grupos religiosos etc. Toqueville considerava que os americanos e os
russos estavam então em franco crescimento demográfico, vindo a ocupar
"amplos espaços vazios", ao contrário dos europeus, "que parecem
ter chegado mais ou menos aos limites traçados pela natureza".
A análise certeira de Toqueville
antecipa em quase dois séculos um campo hoje emergente das ciências sociais, a
demografia política. Seu objetivo é vencer o fosso que separa a ciência
política da montanha de dados populacionais, cujo tratamento matemático é cada
vez mais sofisticado. Quando bem-sucedido, o esforço permite traçar cenários
políticos com razoável grau de confiança. Que o digam os estrategistas de
campanha, sempre prontos a moldar o discurso dos candidatos em função de
eleitorados emergentes, como se vê tanto na disputa pela Casa
Branca como na corrida pela prefeitura de São Paulo.
Os recados da demografia já estão no
radar das campanhas mas ainda custam a chegar à gestão pública. "Não
conheço uma Secretaria de Educação no Brasil que tenha um especialista em
demografia, que saiba quantas crianças vão nascer nos próximos anos e, portanto,
quantas escolas precisam ser abertas ou fechadas", exemplificou a
VEJA o educador João Batista Araujo e Oliveira. É o que lamenta Jack
Goldstone, professor da Universidade George Mason, em Virgínia (EUA). Daí o
livro Demografia política: como as mudanças populacionais estão
remodelando questões de segurança internacional e política nacional (em
tradução livre), que editou em companhia de Eric Kaufmann, da Universidade de
Londres, e Momica Duffy Toft, da Harvard. Lançada em junho de 2012, a obra
alerta para as tendências que vão redesenhar o mundo até 2050.
Essas mudanças já estão em curso e em
boa medida não têm precedente histórico. Isso porque o crescimento populacional
nunca foi tão desigual. Goldstone resume: o mundo de amanhã não será
simplesmente o mundo de hoje, só que com mais gente. As discrepâncias entre os
perfis demográficos tanto de países como, dentro de suas fronteiras, dos grupos
étnicos, religiosos e econômicos exercerão enorme pressão sobre a arena
política, deem-se as disputas nas urnas, nos foros diplomáticos ou nos campos
de batalha.
Bomba
demográfica - Para sucessivos governos israelenses,
desde o primeiro gabinete do premiê David Ben-Gurion, demografia é uma questão
existencial. Yasser Arafat dizia que a altíssima fertilidade das mulheres
palestinas (6,8 filhos em média na Faixa de Gaza) era a 'bomba biológica' que
daria a 'vitória final' sobre os judeus. Por muito tempo, Israel compensou a
diferença das taxas de fertilidade com políticas de estímulo a imigração. Mais
recentemente, entrou no radar dos analistas uma nova força demográfica: os
índices de natalidade de judeus ultraortodoxos (8 filhos por mulher), ainda
mais altos que os de palestinos. Até 2025, 12% dos israelenses serão judeus
ultraordoxos e pode-se prever que esta parcela da população passará a exigir
crescente representação política.
A relação entre fervor religioso e
fecundidade é conhecida dos demógrafos. As principais religiões são todas
entusiastas do casamento e da procriação, com censuras ao divórcio, aborto e
homossexualismo. Famílias muito religiosas são comumente mais numerosas que as
seculares, o que vale tanto para fundamentalistas islâmicos, como judeus
ultraordoxos e cristãos conservadores americanos. Esta diferença explica, por
exemplo, a recente inversão no Líbano, onde muçulmanos passaram cristãos e
hoje são maioria. Em 1971, um raro estudo sobre fertilidade das mulheres
libanesas encontrou os seguintes números: sete filhos em média para muçulmanos
xiitas, quase seis para sunitas, cinco para famílias drusas e entre quatro e
cinco para cristãos.
A cartada
evangélica - O Brasil também caminha para uma
inversão de seu perfil religioso, e a razão é a emergência da população
evangélica, em particular das correntes pentecostais e neopentecostais. Em
1970, 91,8% dos brasileiros eram católicos. Em 2010, eram 64,6%. Mantida a
tendência, evangélicos e católicos se igualarão em no máximo 30 anos, mas desde
já o crescente peso do eleitorado evangélico ganha o primeiro
plano na disputa eleitoral.
Nos Estados Unidos, a mobilização do
eleitorado evangélico é uma cartada eleitoral dos anos 1970 e já não
tem a mesma força em 2012: o perfil
demográfico americano está mudando, e até 2050 o país de protestantes
anglo-saxões será composto majoritariamente por hispânicos, asiáticos e negros.
Esta tendência é interpretada como um trunfo de longo prazo dos democratas, com
quem as minorias, historicamente, têm maior afinidade.
Fonte: Revista Veja
Divulgação: www.juliosevero.com
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