Veja o mapa europeu. A Ucrânia, país que abriga 44
milhões de habitantes espalhadas em 600 mil quilômetros quadrados de campos
verdejantes, é um muro que separa a Rússia da Europa.
Os ucranianos se dividem em dois blocos
antagônicos: os que querem aderir à União Europeia (UE) e os que defendem a
manutenção da influência russa. O primeiro grupo tem ido, em dois meses de
protestos, às ruas aos milhares, digladiando-se com uma polícia armada e
violenta. O segundo é aliado do governo de Viktor Yanukovich e da Rússia.
— A Ucrânia, desde muito tempo atrás, já era vista
como um problema previsível. É o limite para a instalação da UE, a segunda
república mais importante da antiga União Soviética (atrás apenas da Rússia) —
diz o cientista político Christian Lohbauer, membro do Grupo de Análise de
Conjuntura Internacional (Gacint), da Universidade de São Paulo (USP).
Não bastasse a localização geográfica, a
Ucrânia tem campos férteis comparáveis aos da Argentina. É algo como o celeiro
da Europa central. De lá, sai trigo para abastecer a Rússia, que não quer
dividir nem a influência política nem o acesso aos produtos de exportação
ucranianos.
Quem pede o fim da hegemonia russa se viu
frustrado quando Yanukovich rejeitou acordo com a UE, em 21 de novembro. Três
dias depois, 100 mil pessoas foram às ruas contra o governo. Cresceram a
repressão e a intervenção russa na atuação do governo ucraniano, em reuniões e
até no jeito de reprimir, com leis que lembram um estado de exceção.
A situação se acalmou em dezembro, depois
que a Rússia aprovou um resgate financeiro e diminuiu os preços de venda do gás
natural. Com as medidas que limitam as manifestações, a ira da oposição voltou
a ser atiçada, e a semana passada foi marcada por protestos intensos sob 10º C
negativos. Yanukovich se reuniu com líderes dos protestos, mas não houve
acordo. Um dos oposicionistas mais influentes, o campeão mundial de boxe Vitali
Klitschko saiu do encontro dizendo que o presidente "tem sangue de
manifestantes em suas mãos". A UE e a Organização do Tratado do Atlântico
Norter (Otan) condenaram a violência e lamentaram o diálogo frustrado. Os
Estados Unidos retiraram vistos de repressores. A Rússia definiu como
"indecentes" essas críticas, escancarando o confronto latente com EUA
e UE.
Putin tenta manter
liderança
Após defender sua influência no Oriente
Médio, apoiando a ditadura de Bashar al-Assad, Vladimir Putin fincou as garras
russas na Ucrânia e adotou discurso de guardião dos bons costumes contra a
influência ocidental, atitude que se evidencia nas restrições aos homossexuais
e nas prisões de ativistas como as jovens do grupo Pussy Riot (que cantaram uma
"oração punk" contra Putin na catedral de Moscou) e os integrantes do
Greenpeace retidos três meses na Rússia (entre eles, a brasileira Ana Paula Maciel).
— Nos esforçaremos em ser líderes —
escancarou Putin, na semana passada, enfatizando sua intenção de pôr em prática
o projeto de união econômica euroasiática de países criados a partir da
ex-URSS, à qual a Rússia convida com insistência a Ucrânia.
Christian Lohbauer identifica na atuação
russa indícios de desespero para manter a imagem de potência:
— A Rússia é decadente, quer manter
influência. Depende do petróleo, está longe de ter um regime de liberdades, tem
uma sociedade envelhecida e não conta com nichos econômicos de inovação. Por
isso, faz chantagens para manter a influência na Ucrânia.
Cristina Pecequilo, professora de Relações
Internacionais da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), analisa a
trajetória que vem desde 1991, quando a União Soviética foi desmembrada, lembra
as revoltas ucranianas de 10 anos atrás (a Revolução Laranja, em 2004) e fala
em "primavera" para definir o movimento contrário à influência
desempenhada pela Rússia, que, segundo ela, quer "exclusividade".
— A raiz do problema é a resistência russa
em permitir que a Ucrânia se aproxime de organismos internacionais. São
recursos energéticos e alimentícios que estão em jogo, além da influência
geopolítica.
FONTE: http://zerohora.clicrbs.com.br/rs/mundo/noticia/2014/01/conflagrada-por-protestos-ucrania-se-divide-entre-europa-e-russia-4399980.html
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