1. INTRODUÇÃO
No
dia 18 de julho de 2008 estreava a continuação de Batman Begins (2005), Batman
– Cavaleiro das Trevas (doravante, BCT). Sem dúvida, um dos grandes
sucessos do cinema americano dos últimos anos. Nessa introdução queremos
evidenciar dados incontestáveis que nos fazem concluir que BCT é uma obra que
não somente merece ser avaliada como também é uma fonte apropriada de
entendimento do nossozeitgeist (espírito da época).
Em primeiro lugar, a aceitação da
massa. BCT foi o terceiro filme mais rentável de todos os tempos.1 Pressupondo
que a relação entre filme e sociedade é de natureza retroalimentativa, a
aceitação da massa revela muito dela mesma bem como revela a influência da obra
no povo. É fato que em 2008 Batman já tinha noventa e nove anos. Pode-se,
portanto, implicar que Morcego teve tempo suficiente para criar várias gerações
de fãs. Daí a razão de sua aceitação, pode-se sugerir. Mas trata-se de um
grande engano explicar a aceitação de BCT somente pelo histórico do seu herói.
Os parágrafos seguintes elucidarão a questão.
Segundo, trata-se de um filme que superou as
expectativas da crítica especializada. Uma palavra sobre o contexto histórico
ajudará a entender melhor. Para muitos, senão a esmagadora maioria dos
admiradores de Batman, Batman e Robin (1997) acabou com a
reputação do homem-morcego. Denominado de “horrível”, “infantil” (bobo), “sem
conteúdo” e “caro”,2 o filme de Joel Schumacher, que estreou em
1997, foi um fracasso de crítica e de bilheteria. Para os fãs do Cruzado
Encapuzado3, Begins surgiu como o salvador da
imagem do Cavaleiro das Trevas. Por outro lado, a aceitação de Batman
Begins tanto da crítica quanto da massa criou um clima de ceticismo
para com o próximo da série. A razão é simples: tratava-se de uma sequência.
Digo, uma sequência de um filme muito bom. Ora, a reação clássica diante de uma
sequência é sempre a mesma – descrença e ceticismo.
Entretanto, BCT surpreendeu. A crítica
reagiu empolgada4. Muitos deram nota máxima para a segundo filme de
Christopher Nolan (diretor). Comentários como os de Lais Cattassini (Cinema com
Rapadura) revelam tal empolgação: “impossível não vibrar com cada
segundo de filmagem”5. Tiago Siqueira (Cinema com Rapadura)
assegura o lado positivo da obra: “Tenso e emocionalmente pesado, ‘Batman - O
Cavaleiro das Trevas’ não é só um mero filme, mas uma experiência
cinematográfica única. Uma obra-prima absolutamente recomendada”.6
Em terceiro lugar, as atuações
premiadas de um grande elenco. O cast contou com figuras
renomadas e premiadas como Morgan Freeman (Lucius Fox), Michael Caine (Alfred),
Heath Ledger (Coringa), Aaron Eckhart (Dent), Maggie Gyllenhaal (Rachel Dawes).
Em quarto lugar, a morte misteriosa
de Heath Ledger. Ledger (Coringa) é um capítulo a parte. O reconhecimento da
comunidade especializada foi unânime. MTV Movie Awards (EUA) o reconheceu como
o melhor vilão, o Globo de Ouro (EUA), a BAFTA (Reino Unido) e o Oscar (EUA) o
reconheceram como melhor ator coadjuvante. Isabela Boscov, comentarista da
revista Veja, entende que Ledger elevou o padrão “um degrau acima” da atuação
já premiada em Brokeback Mountain. Falando de sua interpretação,
Boscov é direta, “é absolutamente antológica”.7 Todas as
premiações foram póstumas. Ledger faleceu no dia 22 de janeiro de 2008 – seis
meses antes da estréia do filme. Sua morte misteriosa e prematura gerou
especulações e criaram todo um clima de mistério em torno do filme. Muitos
ligaram sua morte com os efeitos da interpretação de Coringa.
Em quinto lugar, e não menos
importante, o conteúdo do filme. A despeito de se tratar de um filme de
super-herói (geralmente ligado público infantil), BCT não é somente
entretenimento.
Não se trata de um filme reduzido a grandes explosões e grandes efeitos
especiais. Ele exige inteligência dos seus “leitores”. A razão é simples: BCT
levanta grandes questões
éticas e filosóficas.
Sem dúvidas, não é um filme para crianças. Temas sobre justiça, o papel da lei,
seus limites, o verdadeiro papel de um herói, loucura e caos são traçados.
Soma-se a isso o fato de que esses mesmos temas não são abordados em pequenos
lampejos, mas em grandes diálogos tornando-se a tônica da obra.
2. SINOPSE
Sequência
do sucesso de ação Batman Begins, Batman – O Cavaleiro das Trevas, volta a
reunir o diretor Christopher Nolan e o astro Christian Bale, reprisando o papel
de Bruce Wayne/Batman. Com a ajuda do comissário Jim Gordon e do novo promotor
Harvey Dent, Batman se dedica a combater de vez o crime organizado em Gotham.
De início, o trio se mostra eficaz, porém eles logo se veem reféns de um
poderoso criminoso conhecido como Coringa, que faz Gotham mergulhar na anarquia
e força o Cavaleiro das Trevas a chegar mais perto do que nunca de ultrapassar
a linha tênue que separa o herói do justiceiro.8
3. COSMOVISÕES SUBJACENTES
3.1.
Ausência de Sobrenatural
Batman é um super-herói diferente. É um herói sem poderes sobre-humanos. Não
sofreu nenhuma mutação, não veio de outro planeta, é repleto de cicatrizes, tem
crises psicológicas, sofre por um amor não resolvido e é perseguido pelo
“fantasma” da perca prematura dos seus pais (determinante em quase tudo em sua
vida).
Ele não somente ajuda os policiais como
também é salvo por eles. Suas virtudes são exclusivamentehumanas.
Especificamente, são virtudes intelectuais e físicas (e.g., habilidade nas
investigações, grande aptidão em artes marciais e, sem máscara, um excelente
homem de negócios). Podemos dizer que Batman é o legítimo e verdadeiro
Super-Homem. Por isso é o herói “mais próximo” do seu público.
Essa característica tão marcante do
homem-morcego, ignorada por Joel Schumacher em Batman e Robin(1997)
foi reverenciada e levada às últimas consequências por Christopher Nolan
(diretor) em BCT. Para Nolan, realidade significa ausência do sobrenatural.
Isso foi evidenciado em sua tentativa de evitar o uso de recursos
computadorizados. Seu objetivo é evitar, ao máximo, no espectador, o
referencial de ficção. Não é atoa que todas as explosões são reais.
Uma das cenas grandiosas do filme é a
destruição do hospital de Gotham. Aqui Nolan não fez qualquer manipulação de
imagem. Um prédio real foi destruído. No filme, é Ledger (Coringa) que aciona
os explosivos. Foi exatamente isso que aconteceu.
Outro exemplo se dá com os equipamentos
do Batman. Todos são reais. Sua moto, assim com sua armadura, realmente existem
e podem ser utilizadas na prática. Essa busca contumaz por uma
maior realidade determinou o custo do filme (180 milhões de dólares) bem como a
rejeição de alguns personagens como Pingüim. Para Nolan, o Pingüim destoava do universo
realista dessa série.
A realidade (ausência do sobrenatural)
do Batman também pode ser vista em suas limitações. Em uma das cenas primorosas
do filme, o Coringa coloca Batman em um dilema: ou ele salvaria a vida de sua
amada (Rachel) ou a vida do promotor público (Dent). Revelando as limitações do
herói, o Piadista afirma: “Você não pode fazer nada com toda sua força”. E
realmente Batman não consegue. Aliás, ele não consegue salvar nenhum deles.
Um dos efeitos dessa
busca pela realidade (sem sobrenatural) é nos aproximar do herói, sua história,
seus sentimentos, bem como seus ideais. A priori se você tem
uma boa saúde, muito dinheiro e um ideal, você também pode ser um Batman.
Porém, como ele, não resolverá todos os dilemas da vida.
3.2. Moral e Ética
Os heróis convencionais seguem as regras. Eles não mentem (geralmente omitem),
não invadem a privacidade de trinta milhões de pessoas e não torturam. Não é
assim com o Batman. É fato que há certo e errado em BCT. Em outras palavras, há
moral para o Cruzado Encapuzado. Porém, isso não é o mesmo que seguir a ética
vigente. Ética e moral são distintos. O primeiro pode ser mudado e violado
enquanto o segundo deve ser obedecido.
Batman vai além do conceito convencional
de herói. Segundo o filme, ele é melhor que um herói. A obra
deixa patente que ser herói não basta. Ele é o agente do bem, mas não pode
estar preso às amarras da ética. Alfred, seu mordomo e conselheiro, afirma que
Batman é a única pessoa que pode tomar a decisão correta, pois ele está além da
lei, ele não responde à lei, ele está “nas trevas”.
Para BCT, a verdade e o legal são
utópicos. Apesar de existir certo e errado, sua aplicação é irreal.Alguém
tem que se sacrificar. Alguém que não está preso às amarras da ética
convencional. Em sua carta de despedida, Rachel, amiga e amada por Batman,
afirma: “O mundo vai sempre precisar do Batman”. Respeitando o contexto da
declaração, ela quis dizer que nunca vai surgir um herói “sem máscaras” que
siga as regras plenamente – um cavaleiro branco.
Como todo homem sem referencial fora de
si mesmo, Batman tem suas próprias regras. Tem moral, mas é ele quem a
determina. Sua ética não é baseada em um senso moral a priori (infinito
e universal). “[…], a posição moral de Batman se origina de uma apreciação da
complexidade do comportamento humano e das formas extremas que ele pode
assumir” 9. Sua única regra é não matar.
Porém, essa regra está ligada a sua experiência de orfandade prematura e
traumática.
A postura de Batman lembra o viver
autêntico do existencialismo de Martin Heidegger.10 Segundo o
Coringa, poucos se encaixam nessa categoria. Batman e o próprio Coringa seriam
um desses. Um (Batman) escolheu combater o crime, o outro
(Coringa) escolheu o cinismo e a loucura. A máfia bem como a
polícia, por outro lado, são “idiotas” (palavras do Coringa) porque, como a
grande maioria, é escrava do sistema. Segundo Joker (Coringa), “o código de
honra deles é uma piada (joke) ruim”.
A tese do Coringa é que as pessoas são
tão boas quanto o mundo (sistema) permite. Não há uma regra universal. No
primeiro sinal de problema ou pressão, o ser humano abandona seus códigos
éticos. Se o sistema permitir, diz o Coringa, as pessoas devorariam umas as
outras. “Anomalias” como Batman e Coringa seguem sua “vida autêntica”. A
diferença, afirma o Coringa, é que agora o sistema precisa do Batman, por isso
o aceita, mas logo o expulsará como a um leproso. Para o Piadista (Joker)
sua rejeição se dá por estar na vanguarda. Ele está além do Batman. O
homem-morcego ainda está preso às regras. E para o Coringa, o único jeito de
viver de uma forma sensata é não ter regras.
Há certa indefinição e/ou incoerência na
postura moral do Batman. Ora ele parece ser um deontologista11quando
não somente não consegue matar o Coringa [talvez sua única regra] como também o
salva e luta com a culpa de mortes que não foi o responsável
direto;12 ora é um perfeito adepto do pragmatismo e/ou
utilitarismo quando se sacrifica sendo odiado escolhendo a mentira como
consolo para o povo. Batman é um enigma entre o mocinho e o
ladrão, entre o que é correto fazer e o que é, de certa forma, ilimitado pela
maldade, crueldade ou o desejo de realizar, pelo mal, o inimaginável. Ele faz o
que é moralmente certo, mas “nas trevas”, ou seja, é um fora da lei.
3.3. Pessimismo
A realidade e proximidade do Batman para com o ser humano não são moldadas pelo
romantismo do modernismo. Por mais que o herói seja inteligente, hábil
fisicamente, possua ideologia e seja um dos homens mais ricos do mundo, ele não
resolve tudo. Aliás, ele não consegue resolver seus próprios problemas.
O objetivo do herói do filme é dos mais nobres:
inspirar o bem. No entanto, sua existência atrai criminosos cada vez mais
loucos como o Coringa. Com toda sua força o herói perde sua amada, e, nas
palavras do promotor Dent (aprovadas pelo próprio Batman), ele não passa do
produto da indiferença e/ou crítica do povo. Aquele em quem Batman aposta suas
fichas para ser o verdadeiro herói de Gotham, o herói sem máscara e seguidor da
lei, acaba se tornando um criminoso – chamado posteriormente de Duas Caras.
O pessimismo não está presente somente
no insucesso de Batman, mas na relação de dependência ontológica entre o bem e
o mal na qual Batman e Coringa estão presos e são seus estereótipos. O filme
coloca o bem como uma resposta ao mal, enquanto o mal só existe porque há o bem
para combatê-lo. Coringa diz para Batman: “Eu te matar? Eu não quero te matar, você
me completa...”. Em outro diálogo Coringa diz: “acho que nós dois estamos
destinados a fazer isso para sempre”.
Batman é um homem tentando resolver os
problemas do seu povo. Porém, sem sucesso. O Coringa é um louco, autodenominado
agente do caos, que tem seus planos, ora são realizados com sucesso, ora são
frustrados. Batman e Coringa representam a luta sem fim entre bem e mal.
Há uma máxima que sintetiza o filme. Ela
aparece tanto no início como no fim da obra. Primeiro na boca do promotor
público (Harvey Dent), posteriormente pela boca do próprio Batman. Segue: “Ou
você morre herói ou vive o bastante para ver você mesmo se tornar vilão”. Esse
aforismo é realizado tanto na vida do promotor que começa como a grande solução
para Gotham e se torna um assassino movido pela vingança e termina com Batman
que assume os crimes que não cometeu para manter a imagem do promotor. Ou seja,
se alguém planeja fazer o bem, só poderá morrer herói se morrer cedo, caso contrário,
se tornará um vilão (pela prática ou pela reputação). É uma questão de tempo.
Nada mais pessimista.
3.4. Esperança Existencialista
Se a eternidade é cíclica e o mal e o bem sempre existirão, o que fazer, então?
Batman prefere a fé (esperança) na mentira do que a verdade que não produz
esperança. Segue seu último diálogo no filme logo após a morte do símbolo de
esperança – o promotor Harvey Dent denominado “Cavaleiro Brilhante”:
–
As pessoas vão perder a esperança (Comissário Gordon).
–
Não vão não. Eles nunca vão saber o que ele fez (Batman).
– Cinco mortos. Dois policiais. Não se pode varrer isso (Gordon).
– Não. O Coringa não pode vencer. Gotham precisa de um herói de verdade
(Batman).
–
Não. (Gordon)
–
Ou você morre herói ou vive o bastante para ver você mesmo se tornar vilão. Eu
posso ser as duas coisas. Porque não sou herói. Não como Harvey. Eu matei
aquelas pessoas. É o que sou (Batman).
– Você não é (Gordon).
–
Eu sou o que Gotham precisar […] Às vezes a verdade não basta. As
pessoas merecem mais. Às vezes as pessoas merecem ter sua fé recompensada. (Batman).13
Destaque para sua última declaração.
Para Batman, a dura realidade de uma vida sem esperança pode ser substituída
pela mentira (aqui no caso não é o mesmo que omissão). Para o Cavaleiro das
Trevas, a recompensa para fé é a realização da mesma, mesmo que seja um
embuste. O que não se pode é parar de esperar. A mentira é um mal menor diante
da falta de esperança. Nesse mundo de injustiças o povo precisa acreditar. É
isso que move as pessoas.
4. MOMENTOS DE
VERDADE
4.1
Os Limites da Justiça Humana
Em Eclesiastes 3:1-15 nos assegura que Deus tem um plano grandioso que abarca
todos os homens e suas ações em todo o tempo. O homem não
decide o seu nascimento e uma vez vivo descobre que pode morrer e ele não
decidiu isso. O mesmo acontece com os vegetais. É Deus quem controla
todas as coisas. Nesse mesmo contexto o autor nos revela que Deus
colocou a eternidade no nosso coração sem dá condições de
resposta sobre o princípio e o fim. Precisamos de Deus, precisamos de Sua
revelação sobre a vida, os valores, o certo, o errado e o bem. Em 3:16-4:16 o
autor apresenta algumas anomalias e aparente contradições que podem ser
implicadas do que acabou de assegurar: o controle de Deus. O verso 11 diz que
Deus fez tudo “formoso”. Mas, o verso 16 diz: “Vi ainda debaixo do sol que no
lugar do juízo reinava a maldade e no lugar da justiça, maldade ainda”.
O Pregador observa que aonde deveria ter
justiça encontramos maldade. Diante desse quadro aonde lançar nossas
esperanças? O texto responde: “Então, disse comigo: Deus julgará o
justo e o perverso; pois há tempo para todo propósito e para toda obra” (3.17).
Em outras palavras, não justiça plena enquanto o homem for seu único
agente.
O filme revela as limitações que a lei
(queda) impõe na aplicação da justiça “maior” (criação). Não dá para fazer o
certo estando “preso” à lei. Por duas razões: as limitações da própria lei bem
como as limitações dos que a aplicam (queda). Usando a terminologia do filme, é
preciso fazer a justiça “nas trevas”.
A constatação de que não se alcança verdadeira
justiça pela força do homem é correta (queda). Não são poucos os que procuram
justiça nos meios convencionais e experimentam frustração. Esperar pela justiça
“dos homens” é esperar demais. O grande diferencial se dá em como devemos
reagir diante de tal constatação (redenção). Aqui os cristãos se
separam tanto do Coringa quanto do Batman. Os cristãos confiam em Deus. Romanos
12.19 é claro: “…não vos vingueis a vós mesmos, amados, mas dai lugar à ira;
porque está escrito: A mim me pertence a vingança; eu é que retribuirei, diz o
Senhor”. Além disso, o reconhecimento das limitações das leis não nos impelem a
aceitar tudo da lei.
O herói das trevas, como nos mitos
antigos, não deixa de ser (ou querer ser) um deus que resolve tudo com suas próprias mãos
(queda). Como cristãos, ficamos com a constatação, porém mudamos na reação.
Lutamos reconhecendo nossas limitações esperando que no final a justiça plena
venha por meio de Deus (redenção).
4.2. Tendência ao mal
Antes de adentrar ao assunto, faz-se necessário descrever uma cena crucial: O
Coringa coloca explosivos em duas barcas. Em uma delas estão “civis inocentes”
(terminologia do filme), em outra, somente presos (condenados por roubo, morte
etc.). O detonador dos explosivos da balsa dos presos ficou no poder dos
cidadãos comuns enquanto o detonador dos explosivos da balsa dos “inocentes”
ficou com os prisioneiros. O Coringa orienta ambas as balsas de que às 00:00h
ele vai explodir ambas caso uma delas não esteja já destruída. Ou seja, o barco
que destruir o outro, estará livre. A hora chega e nenhum barco destrói o
outro. Diante desse quadro Batman diz ao Coringa: “O que você quer provar? Que
lá no fundo todos são podres [ugly] como você? Só
você é podre […] “Essa cidade acabou de mostrar que está cheia de pessoas
que só acreditam no bem”14.
O fato é que o Coringa nesse ponto está
certo. A maioria do barco dos “civis inocentes” decide por explodir o outro
barco. E no barco dos presidiários, um grupo decide matar o responsável pelo
barco para explodir o outro. Ambos os barcos querem explodir o outro, mas, ou
não têm coragem (o barco dos “inocentes”) ou falta oportunidade (o barco dos
condenados). Não faltou vontade (desejo), faltou coragem e oportunidade.
Em resposta ao Batman, o Coringa afirma
que o espírito da cidade não se corrompeu completamente ainda, mas quando
souberem dos atos “heroicos” do promotor (assassinou cinco pessoas) as cadeias
vão ficar cheias. Ele (Coringa) colocou Harvey Dent no mesmo nível dele e do
Batman. Ele agora fazia parte do grupo dos fora da lei. Segundo o Coringa, isso
não foi difícil.
Batman no fundo acredita no Coringa, por
isso escolhe mentir sobre o Harvey assumindo seus crimes. Ele sabe que, no
fundo, o povo vai se rebelar ao saber que o promotor, a esperança de Gotham, é
um assassino. Essa é a tendência da humanidade. Nas palavras do Coringa: “A
loucura é como a gravidade, basta um empurrãozinho”. Se o sistema permitir,
afirma o piadista, “as pessoas civilizadas comerão umas as outras”.
5. Respostas
Bíblicas para Algumas Questões
5.1.
O Sistema e o Indivíduo
No filme a população ou a “massa” muda de acordo com as condições. Apoia o
Batman, no entanto, logo após o Coringa começar a matar pessoas ameaçando não
parar até a revelação do mascarado, todos queriam a revelação de sua identidade;
o que significava o fim de sua vida de herói e o começo de uma vida de
prisioneiro.
Segundo o Coringa: “Loucura é como a
gravidade, basta um empurrãozinho”. O Coringa defende a ideia de uma influência determinante do
sistema nos indivíduos. Para ele, se colocarmos (e isso inclui o sistema) as
pessoas em situações de tensão que elas revelarão quem realmente são – loucas e
sem moral. Isso fica claro quando afirma que “as pessoas são tão boas quanto o
mundo (sistema) permite”. O próprio Batman acredita nisso, quando no final do
filme entendeu que a mentira sobre uma instituição (promotoria pública) era o
melhor para o povo.
A perspectiva Teo-referente, por outro
lado, assegura que nossa cosmovisão é o produto do nosso coração pecaminoso e
apóstata somado às estruturas psíquico-sociais e
histórico-culturais (e.g., educação [formal, e principalmente familiar nos
primeiros anos de vida], cultura regional, relacionamentos, meios de
comunicação). O relacionamento dessas duas nuanças (interna e externa) da construção
da cosmovisão humana deve ser entendido como camadas sobrepostas. O
coração (substrato interno da existência humana) é a matriz primordial seguida
das camadas supracitadas.
Pressupondo uma antropologia bíblica, o
homem, devido ao pecado, consequentemente, não interpreta a vida de forma
neutra ou vazia como se fosse, nas palavras do empirista inglês John Lock, uma tabula
rasa. Pelo contrário, o coração humano é religioso por natureza e após a
queda esse coração continua sendo para-Deus, porém em rebelião.
As Escrituras nos revelam que essa
esfera ou dimensão que chamamos de “coração” é a mais profunda do nosso ser
(self), e por isso, inacessível a toda forma de análise ou procedimento de
sondagem empírica (cf. Sl. 139.23, 24; Jr. 17.10). O acesso só se dá pela
Palavra através do Espírito (1Co 2.13-15; Hb 4.12). A mudança radical de uma
cosmovisão, portanto, é o que a Escritura chama de “regeneração” (Jo 3.3,4; Tt
3.5).
Em síntese, o sistema tem seu papel na
formação das cosmovisões, porém não é determinante. Caso
aceitássemos tal postulado eliminaríamos a culpa do indivíduo. “A
idolatria [no sentido de pecado] é um problema profundamente enraizado no
coração e poderosamente impingido sobre nós pelo ambiente social”15.
A complexidade do ser humano não permite que façamos declarações como as que o
Coringa fez. Nossa tendência, sim, é para o mal. Mas como ele se revelará é
outra história. O mal não tem só uma cara (Cl 2.23; 2Co 5.12; 2Co 11.14).
5.2. O bem e o mal
Muitas são as propostas que têm se levantado diante da problemática do bem e o
mal – sua existência, origem, relação com Deus e entre si. Alguns têm diminuído
o poder de Deus (teísmo aberto); outros versam que o mal não passa de uma
ilusão (Budismo), o que gera outro problema: a ilusão do mal. Outros adotam a
visão do Coringa. Entendem o bem e mal como entidades de dependência
ontológica. O filme (através do Coringa) assegura que o bem como uma resposta ao
mal, enquanto o mal só existe porque há o bem para combatê-lo. Coringa diz para
Batman: “Eu te matar? Eu não quero te matar, você mecompleta...”16
Para os reformadores o mal é definido
como privatio actuosa. O ponto aqui é que o mal não pode
existir em si e de si mesmo. Ele depende da corrupção do bem. A relação de
dependência seria equivalente à do ferro e a ferrugem. O primeiro não depende
do segundo para existir, mas o contrário é fato.
A incoerência de
Coringa é facilmente refutada. Se o bem depende do mal, o mal passa a ser um
bem encoberto. “Mas o mal do qual Deus
extrai o bem é um mal verdadeiro. Da traição cometida por Judas contra Jesus
vem o ato redentor da cruz, mas isso de forma alguma minimiza a perversidade do
ato de Judas”.17 Nessa concepção, para experimentar bem, o
próprio Deus deveria experimentar o mal.
1cf.http://oglobo.globo.com/cultura/mat/2008/08/10/_batman__cavaleiro_das_trevas_lidera_bilheteria_nos_eua_pela_quarta_semana-547664910.asp
Acesso em: 09 de setembro de 2009, 09:28:21. Último segundo IG disse: O novo
filme do Batman, “O Cavaleiro das Trevas”, bateu todos os recordes de
bilheteria nas sessões do final de semana nos cinemas dos Estados Unidos. A
estréia deixou bem atrás a marca sem precedentes conseguida por “O Homem
Aranha”.
cf.http://ultimosegundo.ig.com.br/cultura/2008/07/21/santo_blockbuster_batman_o_cavaleiro_das_trevas_arrasa_nas_bilheterias_1459434.html.
Acesso em: 09 de setembro de 2009, 09:35:19.
2 cf. Alguns comentário em
www.cineplayers.com/filme.php?id=1251. Acesso em 16 se setembro de 2009;
10:29:13. Segundo Diego Sapia Maia, "O problema é que Batman & Robin
não deixa espaço para interpretações, investindo em bobagens e clichês"
(cf. www.cinepop.com.br/criticas/batman4.htm Acesso em 16 de setembro de 2009,
10:33:41). Leonard Maltin disse que "a história frequentemente não fazia
sentido" e que "a ação e os efeitos são altos, enormes e
entorpecentes" (cf. http://pt.shvoong.com/books/1694892-batman-robin/
Acesso 16 de setembro de 2009, 10:37:51). Leandro Gantois diz que "Quem
poderia imaginar que depois de tantos anos de carreira o diretor Joel
Schumacher iria fazer a maior besteira de sua vida, tantos sucessos e obras
inteligentes no passado não foram suficientes para encobrir a porcaria feita
neste quarto filme da série baseada no Homem-Morcego, o Batman" (cf.
www.cinemaemcena.com.br/Critica_Detalhe.aspx?id_critica=2218&id_tipo_critica=1
Acesso: 16 de setembro de 2009; 10:42:11).
3 Outro nome para Batman3 Outro nome para Batman
4 cf. Crítica do New York
Times:http://movies.nytimes.com/2008/07/18/movies/18knig.html?scp=2&sq=
July%2018%202008&st=cse. Acesso em: 22 de setembro de 2009; 09:22:41.
5http://www.cinemacomrapadura.com.br/criticas/1191/batman__o_cavaleiro_das_trevas_(the_dark_knight_batman_begins_2_2008)
Acesso em: 10 de setembro de 2009, 11:17:10 [itálico nosso].
6http://www.cinemacomrapadura.com.br/criticas/1197/batman__o_cavaleiro_das_trevas_(the_dark_knight__batman_begins_2_2008)
Acesso em: 10 de setembro de 2009, 11:20:45.
7 cf.
http://veja.abril.com.br/videos/cinema/batman-cavaleiro-trevas-393880.shtml
acesso: 17 de setembro de 2009; 09:01:12.
8 cf. site oficial:
http://wwws.br.warnerbros.com/thedarkknight/ acesso: 17 de setembro de 2009;
09:30.
9 HOWARD, Jason J. Noites Escuras e o chamada da
Consciência. em IRWIN, William (coord.). Batman e a Filosofia – o
cavaleiro das trevas da alma. São Paulo: 2008, p.182.
10 Segue uma definição de homem autêntico: Honesto para consigo
mesmo sobre o que está ou não sob nosso controle, leva à sério inevitabilidade
da morte bem como assume a responsabilidade total pela direção de sua
vida e deixa claro o propósito e o significado daquilo que faz. Aqui
vale lembrar as palavras de Chesterton: “É mais verdadeiro dizer que um homem
que confia em si mesmo certamente fracassará” (CHESTERTON, G. K. Orthodoxy,
Massachusetts: Hendrickson, 2006, p.10).
11 A figura mais influente da ética deontológica é grande
filósofo Immanuel Kant. Segundo Jensen: “A contínua recusa de Batman em matar,
enquanto prossegue em sua missão, ainda que seja o Coringa, é um exemplo
perfeito do compromisso dele com uma razão moral deontológica” (JENSEN, Randall
M. A Promessa de Batman. Em IRWIN, William (coord.) op. cit.,
p. 85).
12 Em um dos diálogos com Batman, Coringa declara “Você é mesmo
incorruptível”. E continua: “Você não vai me matar por algum senso
equivocado de falso moralismo”.
13 BATMAN cavaleiro das trevas. Direção: Christopher Nolan.
Produção: Emma Thomas, Charles Roven, Christopher Nolan, Los Angeles: Warner
Bros. Entertainment, 2008, DVD 1 (152 min).
14 BATMAN cavaleiro das trevas. Direção: Christopher Nolan. Produção: Emma
Thomas, Charles Roven, Christopher Nolan, Los Angeles: Warner Bros. Entertainment, 2008, DVD 1 (152 min).
15 POWLINSON, David. Ídolos do Coração e Feira das
Vaidades: vida cristã, motivação individual e condicionamento sociológico.
Brasília: Editora refúgio, 1996, p. 33.
16 A versão portuguesa diz: “eu preciso de você”.
17 SPROUL, R. C. Razão para Crer. São Paulo:
Mundo Cristão, 1997, p.85.
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