Carl Lentz e Justin Bieber
De jeans
rasgados na altura dos joelhos, jaqueta de couro justa ao corpo e corte de
cabelo "undercut" - adotado por Brad Pitt e David Beckham -, o pastor
Chris Mendez discursou em São Paulo para centenas de fiéis. Todos pareciam ter
grande interesse em fazer parte de uma das igrejas evangélicas de maior
ressonância - e descoladas - do momento: a australiana Hillsong Church.
A Hillsong é uma igreja presente em 15 países. A filial brasileira
está programada para ser inaugurada em setembro e é a segunda unidade da
entidade na América do Sul - no fim de 2015, ela passou a operar em Buenos
Aires, na Argentina.
"Queremos trabalhar juntos para conquistar esta cidade, este
país e este continente para a glória de Deus, amém!", disse na ocasião o
pastor Mendez, que é filho de argentinos. Ele é o responsável pela
implementação da igreja em território sul-americano.
"Ainda estou buscando o lugar ideal para a Hillsong São Paulo;
por causa do nosso estilo como igreja, provavelmente será um teatro com palco,
telões e jogo de luzes", conta à BBC Brasil o pastor, que até agora já
visitou mais de 25 teatros na capital paulista.
Culto pop
A caça pelo lugar perfeito, que suporte uma performance digna de grandes astros
da música, não é aleatória já que os cultos têm formato de show de pop/rock. A
música é a principal vitrine da igreja.
Fenômeno gospel mundial, a Hillsong também é um selo musical
altamente lucrativo e de alcance mundial. As canções gravadas por suas quatro
bandas (Hillsong Worship, Hillsong United, Young & Free e Hillsong Kids) já
ultrapassaram a marca de 16 milhões de álbuns vendidos.
Em 2015, a United recebeu o Billboard Music Awards de melhor
artista cristão e se prepara para lançar o documentário Hillsong - Let Hope
Rise, dirigido por Michael John Warren, que já documentou o rapper Jay-Z e a
cantora Nicki Minaj.
Os dois artistas, aliás, poderiam muito bem ser parte do
conglomerado. Nas filiais espalhadas pelo mundo, é comum encontrar
personalidades famosas, como a modelo Kendall Jenner, a cantora e atriz Vanessa
Hudgens e o músico Nick Jonas. Mas ninguém elevou tanto a popularidade da
Hillsong nos últimos meses quanto o cantor pop Justin Bieber.
Carl Lentz
"Quero conhecer Jesus", pediu o ídolo aos prantos ao
amigo Carl Lentz, o pastor de braços tatuados que anda por Nova York ostentando
grifes de luxo, como Saint Laurent. Momentos depois, Bieber foi batizado, na
banheira do jogador de basquete Tyson Chandler.
Chave do sucesso
Mas o que atrai tanta gente, entre pessoas comuns e famosas, para os
performáticos cultos da igreja todos os fins de semana?
O pastor Mendez diz que é "o amor por Deus e pelas
pessoas". Já para o professor Ricardo Mariano, pós-doutor em Sociologia da
Religião pela Universidade de São Paulo (USP), a Hillsong percebeu que, nos
tempos atuais, o entretenimento é a chave para o sucesso.
"O entretenimento é a isca para atrair o público mais jovem
que não quer ficar sentado ouvindo sermão de pastor, e a Hillsong faz isso
muito bem", diz.
"As produções dos shows são feitas para envolver o público e
levá-lo a um clima de contemplação e êxtase", analisa Marli Batista Ávila,
coordenadora do curso de Produção Musical da Universidade Anhembi Morumbi, que
destaca os recursos visuais, da tecnologia aos figurinos estilo "urban
chic" dos vocalistas.
A combinação de superproduções musicais, letras religiosas
intimistas e a energia de clube noturno atinge em cheio os mais jovens.
Um relatório da própria igreja distribui seus fiéis por faixa
etária. De acordo com o texto, a "geração Z" (de 5 a 20 anos) e a
"geração Y" (de 20 a 35 anos) compreendem juntos 70% dos membros na
sede.
O carioca Rafael Bitencourt, de 32 anos, fez parte desse último
grupo há três anos. Como a maioria, ele conheceu a Hillsong através da música e
decidiu estudar na Hillsong College, a faculdade da igreja em Sydney, na Austrália, que oferece
cursos de formação de pastores, música, dança, produção e até TV e mídia.
"Estudei liderança e agora voltei ao Brasil para ajudar na
Hillsong São Paulo", conta.
Para Mariano, em São Paulo, a igreja australiana deve cavar um
espaço entre os jovens de classe média, concorrendo com igrejas como Renascer
em Cristo, Bola de Neve Church e Sara Nossa Terra.
Fiéis gays
Todas essas, incluindo a Hillsong, são pentecostais, o que quer dizer que
acreditam em milagres e batismos operados pelo Espírito Santo, e interpretam a
Bíblia de forma semelhante.
"Apesar da atitude ousada no plano estético, a Hillsong mantém
o mesmo discurso conservador de todas as outras", observa Mariano, da USP.
Em uma recente polêmica envolvendo fiéis gays, a igreja mostrou que
mantém a visão "tradicional" evangélica de aceitar apenas a união
homens e mulheres, mas que "aceita" pessoas de todas as orientações
sexuais.
A polêmica veio à tona quando grupos evangélicos americanos
denunciaram que um casal gay teria liderado um culto da igreja em Nova York.
Diante da polêmica, Brian Houston, o pastor fundador da igreja,
publicou um longo texto intitulado "se eu amo os gays?", em que
explica que fiéis LGBT's são bem-vindos na igreja, porém não podem ter cargos
de liderança.
Questionado sobre sua posição em relação à homossexualidade, o
pastor Mendez diz que o trabalho da igreja é aceitar a todos e esperar que Deus
transforme a vida das pessoas.
"Quando Jesus estava na terra, ele não buscava os perfeitos,
mas andava com prostitutas e pecadores", ensina, acrescentando que o casal
ainda faz parte da igreja, mas não mais do coro.
As semelhanças com as igrejas pentecostais brasileiras passam
também pela defesa da castidade até o casamento e pela teologia da
prosperidade, com direito ao livro You Need More Money (Você precisa de mais
dinheiro, em tradução literal), escrito pelo pastor Brian Houston.
Pedra no sapato
Pelo estilo de vida ostensivo, Houston e sua esposa, Bobbie, são criticados com
frequência pela mídia australiana, assim como as altas quantias arrecadadas
pela igreja. Segundo o jornal Sydney Morning Herald, a igreja arrecadou, em
2014, cerca de 80 milhões de dólares australianos (R$ 228 milhões) na Austrália
e outros 100 milhões (R$ 285 milhões) no resto do mundo - tudo livre de
impostos.
Tanya Levin, autora de People in Glass Houses (Pessoas em Casas de
Vidro, em tradução livre), em que relata como viu a pequena comunidade de um
subúrbio de Sydney se tornar a marca global que é hoje, define a Hillsong como
um lugar cheio de "medo e culpa" empenhado em construir um império. À
BBC Brasil, ela disse estar "preocupada" com a influência da marca na
América do Sul.
"É uma igreja que promete riqueza e as pessoas podem dar tudo
o que têm na esperança de serem abençoadas por Deus", comenta. A um site
australiano, o pastor Brian disse que o livro de Levin não tem credibilidade e
que ela quer apenas lucrar com o sucesso da Hillsong.
Enquanto as polêmicas pipocam, o pastor Mendez, que há 10 anos
sonha em trazer a poderosa marca para cá, visita regularmente São Paulo e se
mostra animado com a expansão. "Eu creio que milhares de pessoas tomarão a
decisão de fazer da Hillsong sua casa ao encontrar Jesus... Nós amamos a
América do Sul".
FONTE:http://g1.globo.com/mundo/noticia/2016/02/hillsong-a-igreja-hipster-que-atraiu-justin-bieber-e-busca-sede-em-sao-paulo.html
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