quinta-feira, 2 de setembro de 2010

PASTOR, EM QUEM DEUS DISSE QUE DEVEMOS VOTAR?

Em tempo de eleição essa é uma das dúvidas ais comuns em nossas igrejas. Isto porque, irmãos em Cristo que temem ao Senhor e que desejam fazer o melhor para o seu país, acreditam que os seus pastores receberam de Deus orientações claras quanto àqueles que deverão governar a nação. Nesta perspectiva, buscam em seus líderes orientações em quem votar. No entanto, o que talvez muitos não saibam, é que do ponto de vista ético e cristão, o pastor não possui o direito de manipular o voto de ninguém. Todavia, em virtude de desejos escusos, alguns pastores inescrupulosos, imbuídos de messianismo político fajuto, enganam o povo, determinando ao rebanho o nome daqueles que deverão ser votados.


Caro leitor, como disse anteriormente

Não creio na manipulação religiosa em nome de Deus, não acredito num messianismo onde a utopia de um mundo perfeito se constrói a partir do momento em que crentes são eleitos, nem tampouco comercializo o rebanho de Cristo, vendendo-o por interesses escusos a políticos inescrupulosos.



Diante do exposto gostaria de reproduzir aqui o décalogo do voto ético que foi defendido na década de 90 pela Associação Evangélica Brasileira:


I. O voto é intransferível e inegociável. Com ele o cristão expressa sua consciência como cidadão. Por isso, o voto precisa refletir a compreensão que o cristão tem de seu País, Estado e Município;



II. O cristão não deve violar a sua consciência política. Ele não deve negar sua maneira de ver a realidade social, mesmo que um líder da igreja tente conduzir o voto da comunidade noutra direção;



III. Os pastores e líderes têm obrigação de orientar os fiéis sobre como votar com ética e com discernimento. No entanto, a bem de sua credibilidade, o pastor evitará transformar o processo de elucidação política num projeto de manipulação e indução político-partidário;

IV. Os líderes evangélicos devem ser lúcidos e democráticos. Portanto, melhor do que indicar em quem a comunidade deve votar é organizar debates multipartidários, nos quais, simultânea ou alternadamente, representantes das correntes partidárias possam ser ouvidos sem preconceitos;

V. A diversidade social, econômica e ideológica que caracteriza a igreja evangélica no Brasil impõe que não sejam conduzidos processos de apoio a candidatos ou partidos dentro da igreja, sob pena de constranger os eleitores (o que é criminoso) e de dividir a comunidade;



VI. Nenhum cristão deve se sentir obrigado a votar em um candidato pelo simples fato de ele se confessar cristão evangélico. Antes disso, os evangélicos devem discernir se os candidatos ditos cristãos são pessoas lúcidas e comprometidos com as causas de justiça e da verdade. E mais: é fundamental que o candidato evangélico queira se eleger para propósitos maiores do que apenas defender os interesses imediatos de um grupo religioso ou de uma denominação evangélica. É óbvio que a igreja tem interesses que passam também pela dimensão político-institucional. Todavia, é mesquinho e pequeno demais pretender eleger alguém apenas para defender interesses restritos às causas temporais da igreja. Um político de fé evangélica tem que ser, sobretudo, um evangélico na política e não apenas um "despachante" de igrejas. Ao defender os direitos universais do homem, a democracia, o estado leigo, entre outras conquistas, o cristão estará defendendo a Igreja.



VII. Os fins não justificam os meios. Portanto, o eleitor cristão não deve jamais aceitar a desculpa de que um evangélico político votou de determinada maneira porque obteve a promessa de que, em assim fazendo, conseguiria alguns benefícios para a igreja, sejam rádios, concessões de TV, terrenos para templos, linhas de crédito bancário, propriedades, tratamento especial perante a lei ou outros "trocos", ainda que menores. Conquanto todos assumamos que nos bastidores da política haja acordos e composições de interesse, não se pode, entretanto, admitir que tais "acertos" impliquem na prostituição da consciência cristã, mesmo que a "recompensa" seja, aparentemente, muito boa para a expansão da causa evangélica. Jesus Cristo não aceitou ganhar os "reinos deste mundo" por quaisquer meios, Ele preferiu o caminho da cruz.



VIII. Os votos para Presidente da República e para cargos majoritários devem, sobretudo, basear-se em programas de governo, e no conjunto das forças partidárias por detrás de tais candidaturas que, no Brasil, são, em extremo, determinantes; não em função de "boatos" do tipo: "O candidato tal é ateu"; ou: "O fulano vai fechar as igrejas"; ou: "O sicrano não vai dar nada para os evangélicos"; ou ainda: "O beltrano é bom porque dará muito para os evangélicos". É bom saber que a Constituição do país não dá a quem quer que seja o poder de limitar a liberdade religiosa de qualquer grupo. Além disso, é válido observar que aqueles que espalham tais boatos, quase sempre, têm a intenção de induzir os votos dos eleitores assustados e impressionados, na direção de um candidato com o qual estejam comprometidos.

IX. Sempre que um eleitor evangélico estiver diante de um impasse do tipo: "o candidato evangélico é ótimo, mas seu partido não é o que eu gosto", é compreensível que dê um "voto de confiança" a esse irmão na fé, desde que ele tenha as qualificações para o cargo. Entretanto, é de bom alvitre considerar que ninguém atua sozinho, por melhor que seja o irmão, em questão, ele dificilmente transcenderá a agremiação política de que é membro, ou as forças políticas que o apóiem.


X. Nenhum eleitor evangélico deve se sentir culpado por ter opinião política diferente da de seu pastor ou líder espiritual. O pastor deve ser obedecido em tudo aquilo que ensina sobre a Palavra de Deus, de acordo com ela. No entanto, no âmbito político-partidário, a opinião do pastor deve ser ouvida apenas como a palavra de um cidadão, e não como uma profecia divina.


Soli Deo Gloria!


***
Renato Vargens é pastor, escritor e colunista do Púlpito Cristão


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